Instituto Brasileiro de Museus

Museu Histórico de Alcântara

Histórico do MCHA

O Museu

O sobrado nº 7, que abriga o Museu Casa Histórica de Alcântara, foi construído no início do século XIX pelo comendador José Maria Correia de Souza, um imigrante português que enriqueceu no Brasil. Seus primeiros proprietários foram os Barões de São Bento, Francisco Mariano de Viveiros Sobrinho e sua esposa D. Mariana Francisca Correia de Souza, filha do Comendador.

Em 1889, o sobrado e parte do seu mobiliário foram vendidos aos Guimarães, comerciantes, que instalaram na área térrea do imóvel uma botica, uma loja de gêneros alimentícios, utilitários domésticos e agrícolas e uma loja de tecidos e armarinhos. Com o falecimento do patriarca da família, Sr. Antonino da Silva Guimarães em 1947, o comércio foi sendo, gradativamente, desativado pelos seus descendentes.

No ano de 1986, o imóvel e todo o mobiliário, pratarias, vidraria de farmácia, alfaias, peças de vestuário e demais objetos de valor histórico existentes foram desapropriados pelo Governo Federal através do decreto nº 93.656 de 05 de dezembro com a finalidade de instalar uma Casa de Época.

Em 1987 o imóvel passou para a guarda do IPHAN, e ao longo de dezoito anos foram realizadas diversas obras de intervenção, recuperação e adaptação para abrigar o museu, restauro e inventario do acervo e oficinas de capacitação ministradas pela museóloga Célia Cursino e pela Arquiteta Evelina Grumberg.

Com a missão de “Promover o patrimônio cultural da cidade de Alcântara aos visitantes e prestar serviços à sociedade alcantarense através de ações sócio/educativas promovendo a difusão do patrimônio cultural do município, contribuindo para o fortalecimento, valorização e proteção da identidade da população local” o Museu Casa Histórica de Alcântara inaugurou em junho de 2004 e iniciou suas atividades ao público em novembro do mesmo ano.

A partir de janeiro de 2007, através da Portaria nº 43 o Museu passa para a gestão administrativa, financeira e patrimonial do Departamento de Museus e Centros Cultural – DEMU/IPHAN e em janeiro de 2009 para a esfera do Instituto Brasileiro de Museus.

 O Sobrado

“[…] está implantada em esquina, com acesso principal voltado para a Praça da Matriz, fachadas dotadas de vãos em cantaria lioz com adornos em estuque e balcões saltados no sobrado e no mirante. de suas salas inferiores, uma delas guarda ares de Botica, adaptação feita desde 1890. Completam a composição da fachada beiral em beira-seveira, friso e cimalha em argamassa.

A implantação na forma de “V” surpreende, moldando o edifício ao formato irregular do lote. A casa se distribui em três espaços fundamentalmente: o pavimento térreo, detinado ao comércio; o andar superior, palco da vida em família; e o pátio interno, intersecção destes dois universos, destinado aos serviços de ambos. Destacam-se elementos elementos como  o delicado barrado azulejado que acompanha o hall da escada, possivelmente de meados do século XIX, apogeu econômico da cidade. Estes caracterizam-se por serem peças de desenho executado pela técnica Majólica (pintados a mão livre), com motivos fitomórficos ou florais. No entanto, é na varanda do pavimento superior que a informalidade rural das oligarquias agrárias manifesta-se plenamente, limitando o fechamento a uma balaustrada composta por peças simplórias entalhadas em madeira, montando guarda-corpo singelo, fazendo lembrar os alpendres das fazendas da região.

Texto de Ivo Matos Barreto Júnior, arquiteto e urbanista.

Fonte do texto: São Luís Ilha do Maranhão e Alcântara: guia de arquitetura e paisagem. Sevilla: Consejería de Obras Públicas y Transportes, Dirección General de Arquitectura y Vivienda, 2008. p. 364

 Missão

Os museus históricos, segundo Ulpiano Menezes, foram criados com um intuito claro de “acatar, celebrar e fixar modelos de valores e comportamentos”, por meio da promoção de determinados personagens que encarnam esses elementos. Essa função atribuída aos museus históricos se confunde com o papel que se atribuía a História enquanto ciência: legitimadora de construções sociais, políticas e econômicas, que apresentava uma verdade pronta e acabada sobre o passado. Era um período em que os historiadores se ocupavam dos grandes vultos, dos fatos extraordinários, dos acontecimentos ligados as dinastias, aos governantes, aos grandes nomes. Só mereciam estudos os aspectos econômicos, políticos e militares. O cotidiano, a vida e os esforços das pessoas comuns, as mentalidades e o imaginário, eram aspectos desprezados, vistos como desimportantes, indignos de estudos e análises. Mulheres, escravos, trabalhadores, crianças, não eram vistos como atores históricos de fato.

Apesar de ser comum detectar permanências desse paradigma, a história mudou muito nas últimas décadas. Diversas gerações de estudiosos tomaram consciência da importância de tais estudos, e aqueles aspectos antes ostracizados são hoje centrais nos esforços dos historiadores.

Nosso trabalho no Museu Casa Histórica de Alcântara se desenvolve dentro dessas novas perspectivas historiográficas. Nossa instituição preserva elementos importantes que permitem compreender um pedaço da história do Brasil e do Maranhão. O prédio, construído no início do século XIX, fugindo do destino de seus coevos hoje arruinados, exibe em seus traços arquitetônicos as características do contexto em que apareceu: suas senzalas indicam que é fruto de uma sociedade escravocrata, sua divisão interna demonstra a composição patriarcal das famílias. O conteúdo do prédio, seu mobiliário, seus instrumentos de trabalho e utensílios domésticos, documentam os padrões do cotidiano, os hábitos corriqueiros que delineiam as formas de pensar e agir, as formas de sociabilidade, as relações de gênero, a religiosidade. Tal acervo se enriquece quando se percebe um “hibridismo temporal”, a presença e convivência de objetos produzidos em períodos diferentes, agregados pela última família que ali viveu, ao longo da primeira metade do século XX. É uma transição histórica que se revela: hábitos que permanecem, novidades tecnológicas que se incorporam aos velhos móveis, o encontro dos séculos XIX e XX.

Olhada por este prisma, nossa instituição se manifesta como um importante documento histórico, cristalizando materialmente o processo de transição entre a Monarquia e a República, momento em que a antiga aristocracia rural perde espaço e um novo segmento, ligado as atividades urbanas, se consolida.

Essa riqueza histórica impressa no Museu Casa Histórica de Alcântara seria inócua, no entanto, se representasse a finalidade última dessa instituição. Mais do que ser meramente a guardiã desse legado, a Casa procura tornar-se intermediária dele com a sociedade circundante, concorrendo para a formação de uma consciência crítica e para a discussão, compreensão e ação direta na realidade local. Projetos como o de resgate da memória local, formando um acervo audiovisual, as diversas oficinas realizadas anualmente, as palestras e ciclos de debate e as atividades educativas visam tornar o Museu Casa Histórica de Alcântara um ator social importante na comunidade.

Antônio Lopes, historiador maranhense, lançou nos anos 1950 a fórmula que definia Alcântara: “ontem uma grandeza, hoje uma ruína: amanhã o que será?” Nosso trabalho visa, acima de tudo, proporcionar uma resposta positiva a esse enigma.